segunda-feira, 2 de abril de 2007

Simplicidade Voluntária - Um regresso às origens?

Um novo movimento surge em países altamente consumistas, como os Estados Unidos, que sempre pensaram em simplificar a vida inventando mil e um produtos para o dia-a-dia de donas-de-casa e executivos.
Engraçado é que, se a idéia original era simplificar para que sobrasse tempo para as pessoas fazerem o que gostam, para curtirem a vida, o que aconteceu foi exactamente o contrário. Inúmeras atribuições, mais e mais trabalho para se ganhar muito dinheiro e consumir tudo o que vai sendo criado. E ninguém se lembra mais porque foi mesmo que tudo começou, esta roda-viva de inventos que a cada dia é suplantada por uma nova safra, mais tecnologia mais sofisticada e cara.
Simplicidade voluntária pode soar como um sacrilégio para muitas pessoas, especialmente as que adoram consumir. Para essas, nada como os shoppings centers da vida, onde se compra de tudo.
Na terra do consumismo surge um movimento formado por pessoas um tanto diferentes, que advogam um retorno à vida simples. Para que se matar de trabalhar para comprar um monte de inutilidades que depois nem se sabe onde guardar? Não é melhor trabalhar menos, passear mais, ter mais tempo para o lazer, para estar em contacto com a família, os amigos, a natureza, para se curtir um hobby, um passatempo favorito? "Ser" mais ao invés de "ter" mais?

Será que as pessoas precisam "mesmo" de telemóvel para pôr o pé na padaria da esquina? Ou dar uma caminhada no quarteirão? Será que precisamos "mesmo" ter não sei quantos pares de ténis, de sandálias, de sapatos de todas as cores, com as respectivas bolsas para combinar? Será que precisamos "mesmo" ter tantas peças no guarda-roupas? Comprar tantos produtos de beleza e verificar que continua tudo igual? Será que a beleza não vem de dentro para fora? Precisamos realmente comer tantas porcarias e tomar tantos refrigerantes? Isto é saudável? Precisamos "mesmo" da muleta do cigarro, da bebida, até da droga para nos sentirmos "gente"? Isso realmente faz-nos tão felizes assim? Precisamos realmente daquele jipe, não só despertando a cobiça dos ladrões, como também expondo as nossas vidas ao perigo de assaltos? Claro que sim, vão responder alguns, é o "sagrado direito de comprar o que se entende, de ter o que se quer, se temos dinheiro para tal".
Porque será que as pessoas se voltam tanto para fora de si e não olham para dentro delas mesmas? Para que tantas luzes a piscar nas noites das grandes cidades, para que tantos outdoors, para quê tanto barulho? Será para chamar a nossa atenção para o que nos "falta", para tudo que não temos e achamos que precisamos para sermos felizes? É, os homens do marketing da felicidade fácil estão a facturar, e como! Mas então, porque será que as pessoas parecem cada vez mais infelizes, mais tristes e vazias?

Porque será que o amor se vulgarizou tanto? Por que estamos sempre em busca de algo que não sabemos o que seja. Algo fora de nós, algo longe, distante, onde, onde? Os relacionamentos são tão fugazes... Ficamos na superfície, quase sempre. Não mergulhamos fundo, temos medo. Medo de nos envolvermos de verdade, de nos comprometermos. E queremos tanto ser felizes!... E buscamos, buscamos. E não podemos esquecer-nos de marcar a terapia com o psicólogo para a semana que vem. "O Reino de Deus está dentro de vós", disse Jesus de Nazaré. Porque buscar fora de nós o que está dentro de nós? No auge da guerra dos EUA contra os Talibans, li no jornal uma frase de um daqueles chefes tribais talvez ao ser perguntado pelo repórter sobre a aridez, pobreza do povo da região: "O ser humano não precisa de muita coisa para viver!" E, na verdade, olhem os índios brasileiros quando os portugueses chegaram aqui. Eram saudáveis, bonitos e felizes. O homem branco foi quem lhes presenteou com os mais variados tipos de doença e vícios do civilizado, dizimando as suas tribos. E o que "possuíam" então? A natureza, a vida simples, a liberdade, a pureza, o espírito de comunidade, fraternidade, solidariedade e tantas coisas assim.

Pois, surge agora, em algumas partes do mundo, esse saudável movimento de volta à vida simples. Cada um olhando em volta de si, tanto na sua vida pessoal, como na sua família, no seu ambiente doméstico, na sua casa, seu trabalho, no seu escritório, o lugar físico em si, podem começar já com uma limpeza. Podem começar a repensar os vossos (contra) valores. Comecem a partilhar o seu supérfluo pois existem milhões que não têm o essencial para viver. Não têm o que comer no seu dia-a-dia. Enquanto isso, não sabemos onde guardar tanta quinquilharia. Gastamos o nosso dinheiro, nos endividamos com aquilo que não nos sacia. Quem não tem dinheiro venha também! Para quê gastar dinheiro com coisas que não alimentam?

Existem já diversas comunidades no Brasil que fazem reuniões regulares sobre esta temática, sobretudo no Rio de Janeiro e Porto Alegre. Eu não preciso ir a nenhuma delas. Esta foi a minha grande aprendizagem na minha vivência para o Brasil. Aprendi a libertar-me das minhas enormes futilidades de outrora, a olhar para o próximo e a ter uma vida mais regrada. Não é moralismo, nem falsidade...é uma lição de vida que aconselho a todos vós!

10 comentários:

Maríita disse...

:o)! E que aprendizagem. É sempre muito complicado desfazermos aquilo que nos é quase inato ou talvez imposto pela sociedade.

Beijinhos

Sofia disse...

Esse movimento vem tomando força, já foi tema de reportagem, quem diria, na Rede Globo.
Eu acho muito importante que as pessoas diferenciem "desapego" de "sacrifício". Desapego é quando as pessoas finalmente compreendem que podem ser felizes com pouco e não sentem falta dos "luxos". É difícil, principalmente porque somos medidos e cobrados pelos parâmetros de uma sociedade absolutamente consumista.
Parabéns pelo desapego !
Abraços,

Anónimo disse...

Grande Pedro,

Não te estava nada a ver fazer este ataque ao "sistema"...
Mas, enfim, parece que isso é mais um sinal óbvio de que nem Portugal nem o Brasil são, de facto, um estado liberal, onde o cidadão é "consumisticamente" responsável.

Sandra Neves disse...

Um excelente conselho!!
Vivemos no mundo do mais vale parecê-lo do que sê-lo... infelizmente.
E esse lema tem sido aplicado a tudo, amigos, profissões, relações...
Esquecem-se é que podem até ter, mas nunca o serão... porque certas coisas não se compram, merecem-se... e depois de as merecer aproveitam-se e vivem-se!

Rubi disse...

Excelente texto. O último no meu canto aborda, de forma mais tímida, os meus anseios pela vida do campo. Ainda não tinha vindo aqui, mas este texto veio reforçar o que penso. Concordo plenamente. Despojar-se e encontrar-se...Beijo

Carocha disse...

Excelente reflexão esta. Benvindo ao mundo em que se previlegia o ter, em deterimento do ser. O consumidor tornou-se num bebé a chorar constantemente pelo biberão. E dizem que não há dinheiro. Portugal nem se pode comparar economicamente aos E.U.A., mas está igualmente transformado num país de consumismo! Mais grave que a influência negativa na qualidade de vida, é o problema do lixo. Será que ninguém pára para pensar nisto?

Lara disse...

É a evolução meu caro... a maldita evolução.

beijo

bad

Tati disse...

Maravilha, este texto vai para a sala de aula! Pelo menos para a minha sexta série, com certeza!!!
Soube de uma novaiorquina que fez uma "experiência" e ficou UM ANO sem comprar NADA, além de comida e necessidades básicas. Tão mosca branca que rendeu um livro e fama mundial.
Concordo 100% com cada palavra, e fico muito triste ao ouvir de alunas (sim, infelizmente nós, mulheres, lideramos o ranking do consumismo... shame on us)que PRECISA ter aquela blusa!!!!!
Hoje mesmo pedi a eles que alugassem dois filmes:
"Crianças invisíveis"
e
"Nascidos em Bordéis"
para eles repensarem seus papéis no mundo....
E assim vamos nós, caminhando passo a passo, buscando um pouco de ar nessa loucura do verbo TER!.....
Grande abraço!

Gi disse...

O TER,o SER. Em detrimento desta última vivemos nma sociedade em que todos se prezam em pertencer à 1ª, nem que para isso tenham que
PARECER. Vivemos num mundo de aparências e ilusões. Curiosamente num mundo de contradições também. Muitos por certo se lembram que há uns anos (largos) as pessoas escondiam um pouco as suas misérias, as suas necessidades. De hoje em dia o que mais se ouve , é : isto está mal, estou completamente teso, o dinheiro não chega para nada... um pouco a política dos desgraçadinho... e contudo continuam a consumir, a gastar o plafoond dos cartões de crédito até ao limite, a fazerem recurso ao pequenos crédito co taxas exorbitantes...é demais para o meu entendimento. A isto também eu chamo de miséria humana.

Anónimo disse...

Estou pasmada com este post!!!!
Grandes mudanças...
Não paras de me surpreender. Cada vez me orgulho mais do meu Amigo, último e dignissimo membro da "nobreza decadente".