quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

O Grande Aventureiro


Extraordinária personagem da literatura e dos descobrimentos, Fernão Mendes Pinto é o grande aventureiro português. O Marco Pólo lusitano. Da simplicidade de Montemor-o-Velho, viajou entre a exuberante Índia, a misteriosa China e o exótico Japão. Experiências que o levaram a escrever a Peregrinação, extraordinário livro de viagens e aventuras, e a tornar-se uma referência da época de glória de Portugal. Pirata, soldado, mendigo, cativo... Mostrou como os homens, em qualquer parte do mundo, são iguais.
Fernão Mendes Pinto era um escritor talentoso, mas talvez seja lembrado sobretudo pela sua dedicação ao relato das aventuras dos descobrimentos. A sua Peregrinação contribui para esta reivindicação à história. O escritor foi protagonista de uma pequena grande história.

Oriundo de uma família de Montemor-o-Velho, cedo tomou contacto com a luxuosa vida na corte. Era ainda muito pequeno quando um tio o levou para Lisboa e o colocou ao serviço na casa do duque D. Jorge, filho natural do rei D. João II. Ali trabalhou durante cinco anos, dois dos quais como moço de câmara do próprio duque, o que lhe possibilitou preservar o elevado estatuto social da sua família, contrariando a precária situação económica que atravessava.
É aos 27 anos que parte para a Índia, ao encontro de dois dos seus irmãos, iniciando assim uma aventura ímpar na história de Portugal.
A sua viagem é contada na obra que escreve, anos mais tarde, já regressado a Portugal. A Peregrinação é um fantástico livro de viagens que relata, ao pormenor, todas as façanhas, aventuras e desventuras de Fernão Mendes Pinto. O seu conteúdo é exótico e raro. Descreve detalhadamente a geografia de destinos longínquos e desconhecidos para a época, como Índia, China, Birmânia, Sião e Japão. Mostra os costumes, credos e tradições destas culturas orientais. O autor é tão descritivo e aventuroso que fez nascer um rol de ironias à volta da obra. Ninguém acreditava ser possível assistir a tantas festas, guerras e funerais, tudo tão diferente e estranho ao mundo ocidental. Foi tão pouco levado a sério que muitos deixaram de chamá-lo pelo nome. Tratavam-no por “Fernão, Mentes? Minto!”. Ainda hoje é assim conhecido.
O problema de Peregrinação, para a época, foi apenas este: o autor contava coisas totalmente desconhecidas. Ninguém aceitava que o Oriente fosse assim.

A entrada na Companhia de Jesus alterou-lhe a personalidade. Libertou todos os seus escravos, entregou a sua fortuna aos pobres e à própria ordem religiosa, em Goa. Contudo, a sua missão como “irmão leigo” dura apenas até 1557, ano em que decide pôr ponto final nessa aventura. A decisão advém da viagem que faz, novamente ao Japão, em 1554, como noviço da Companhia de Jesus e embaixador do vice-rei D. Afonso de Noronha, junto do rei de Bungo. O desencanto foi total, quer com o comportamento do seu companheiro quer com a própria Companhia. Um desgosto que o faz regressar a Portugal. Um homem que faz do seu medo a sua coragem. Personifica a aventura do português do século XVI, que não tem poder e embarca para se safar, que aprendeu tudo o que tinha para aprender. Como os nossos emigrantes.

Já de volta ao seu país e com a ajuda do ex-governador da Índia, Francisco Barreto, Fernão Mendes Pinto compila documentos que comprovam os sacrifícios que realizou pela pátria, tendo direito a uma pensão, que… nunca chegou a receber. O escritor não queria apenas uma colher de compaixão. Queria mais do que isso. Depois deste episódio, voltou-se, abatido, e mergulhou na escuridão. Desiludido, arrumou a vontade e partiu para Vale de Rosal, em Almada, onde escreveu, entre 1570 e 1578, a sua inigualável Peregrinação. A obra só foi publicada 20 anos após a sua morte.
Mensageiro da verdade ou criador de ilusões, Fernão é um guerreiro, um sobrevivente. Como diz Carlos Magno, “é o nosso Marco Pólo. Se fosse americano, certamente Spielberg já teria feito um filme sobre ele”.

3 comentários:

O Réprobo disse...

Meu Caro Capitão-Mor, pouco importa a fidedignidade, era um notável contador, pelo que está justificado.
Quanto aos transes e cumes que experimentou, já o tinha pensado como uma personificação da Roda da Fortuna, ora em cima, ora em baixo.
Abraço

Rubi disse...

Admiro imenso o Fernão Mendes Pinto, e hoje brindaste-nos com dois belos textos :)

Beijão

AnadoCastelo disse...

Primeiro: obrigado por este belo texto.
Segundo: parece que o reconhecimento dos nossos cérebros não são de agora, já nessa altura se punham de lado (apesar das diferenças de época, claro).
Terceiro: de qualquer maneira, grande aventura para a época, não?
Bjs